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sábado, 4 de junho de 2011

ENTREVISTA COM MC RALPH

MC Ralph é jornalista, pesquisador musical, compositor e improvisador. Trabalha a três anos na rádio 107,7 FM; a única rádio educativa do Vale do Paraíba. É MC desde 1999; e já lançou dois álbuns (“Gírias nacionais” e “No fundo do baú”). É conhecido pela arte do Freestyle (repente do rap) e é campeão da batalha de MCs do prêmio Hutuz. Com isso, passou a se apresentar com maior freqüência no estado do Rio de Janeiro e na capital paulista. Militante e artista do movimento Hip Hop no Vale do Paraíba; busca preservar esta cultura, quebrando preconceitos e mostrando um trabalho inovador.

Mc Ralph "Os Afro-raps estao Chegando"


HH Vale – Como você iniciou no Hip Hop?
Ralph
- Comecei ouvindo rap, principalmente Thaíde & DJ Hum. Na época, a gente ouvia mais Consciência Humana e Racionais Mc’s, daí meu primo ganhou o cd do Thaíde (Preste Atenção), não curtiu e me deu. Naquele momento, eu comecei a entender o que era a cultura hip hop, além do rap.

Automaticamente comecei a escrever os meus raps em cima de uns LP de base que comprei em um sebo de Taubaté. Passei por aquele processo de “iniciação” (risos) de gravar toscamente a voz e o beat numa fitinha cassete.

E assim foi indo, comecei a “colar” na Praça do Monumento onde os bboys se reuniam para dançar, e ali começaram a surgir rodas de freestyle que eu participava com a “rapa”. Também comecei a ir aos ensaios do grupo Cidadãos Brasileiros e ali me apaixonei de vez pelo rap. Os ensaios eram feitos na casa do vocalista Sam, em um quartinho cheio de coisas coladas na parede, com saída pra laje. Eles tinham uma “pegada” meio Doctor Mc’s e aquele ambiente me envolveu mesmo, sabe, tinha a alma do rap verdadeiro. Graças a Deus eu entrei de cabeça no movimento.

HH Vale – Quais são suas influência musicais, que despertou o seu interesse em ser MC?
Ralph - Influências musicais são várias: de Raul Seixas à Erykah Badu. Mas o que me fez começar a escrever mesmo, foi Thaíde. Prestei atenção mesmo no que o mano “veio” disse! (risos).

HH Vale - Você é formado em Jornalismo e trabalha em uma rádio educativa. Conta um pouco desse universo que anda paralelo com seu trabalho artístico.
Ralph - Então, fiz jornalismo, comecei a fazer estágio na rádio 107,7 e gostei bastante do esquema desse veículo. Depois que me formei, prestei concurso para operador de áudio, onde estou há cinco anos. Agradeço muito por poder trabalhar todo dia com música. Na rádio ampliei bastante meu conhecimento musical.

HH Vale – Você tem uma facilidade em fazer um freestyle agressivo sem ser grosseiro. Além de ter talento para isso, como você consegue fazer esses seus improvisos?
Ralph – Pô! Fico feliz de poder transmitir esse sentimento! Na real, o freestyle é alma pura. O momento do improviso é muito precioso, não é só combinação de palavras, tem que saber combinar as rimas com a emoção. Porque isso é que o público quer sentir, a rapaziada gosta quando você manda uma vibe sincera, que eles sentem que são responsáveis por aquilo. E tem que ter um estilo próprio, não adianta copiar o estilo de improvisar de mc’s consagrados, como alguns caras estão fazendo. Você pode admirar (e deve) os bons improvisadores, mas você tem que buscar dentro de você, na sua essência, o seu próprio estilo. Isso é hip hop original!

HH Vale - Nota-se uma influência religiosa muito grande nas suas rimas. Como isso começou aflorar?
Ralph – Então, sinto muito o lance espiritual na música. Sempre senti essa “parada” mística que ronda a música. Desde Raul Seixas, desde moleque “saca”?! Daí veio o hip hop, a chamada da “consciência da sabedoria”. Isso é muito forte, está ligado com a busca do nosso espírito. Um lance além do cotidiano, do sistema materialista.

A mensagem do APC16 bateu forte dentro de mim também e eu sempre gostei das mensagens bíblicas e da mensagem cristã. Assim fui sendo levado pela vida numa busca da espiritualidade aliada ao meu rap. Mas tinha alguma coisa faltando; existia um choque entre o jeito de ver as coisas dos evangélicos em geral com a essência, com a raiz da cultura hip hop. Tinha muito preconceito com a cultura e com a espiritualidade africana e eu nunca entendi isso.

Com o tempo fui direcionando melhor minha espiritualidade, aprendendo com os rastafari, com a umbanda, com o folclore, com os espíritas e também com os crentes. Mas hoje consigo ver tudo de um modo mais amplo, para mim, a verdade é uma só. Deus é um só, mas se manifesta de várias maneiras.

Então, isso me mostrou melhor o que eu queria ver, meu rap é espiritual, busca positividade, tenta resgatar a consciência, estimular o conhecimento, lembrar do que o Mestre dos mestres ensinou. Amar a Deus acima de todas as coisas. Amar ao próximo como a si mesmo. Amar a natureza, viver em harmonia, lembrar do sol, da lua, das estrelas e nessa busca, eu vou seguindo.

HH Vale - Os “Afro Raps" será o nome do seu novo disco. Quais as influências que você usou para elaboração dele?
Ralph – Então, esse disco é um verdadeiro filho. Mas também é um pai, porque fazendo esse disco eu aprendi muito. Aprendi musicalmente e espiritualmente.
A idéia é fazer um rap com mais alma, resgatando a presença forte do tambor nos beats, resgatando a brasilidade através do violão e sem perder o peso do rap. Com bumbo, caixa,loops, etc... E nas letras, busquei resgatar um pouco do sentimento do povo brasileiro, dos mitos, das lendas; uma parada que é rara no rap, por ser muito urbano. É pra quebrar preconceitos. Um disco que respeita as forças da natureza, do ponto de vista mais afro-indígena. Com fortes referências à divindades como Iemanjá, Xangô, Oxóssi, Ogum, Oxalá, Obaluaê, Oxum, etc...

E o que me fez começar com essa idéia foram os “afro-sambas” do Vinícius e do Baden. Além disso, quero que a rapaziada mais nova vá atrás do conhecimento da música afro-brasileira. Quero que o disco desperte a sede de beber na mesma fonte que eu bebi pra criar.

HH Vale - Como você vê a questão do movimento hip hop no Vale do Paraíba? E o que você acha que pode ser acrescentado neste cenário?
Ralph - Eu estou muito feliz com o crescimento da cultura no Vale. A qualidade dos trabalhos (falando mais do rap) evoluiu muito. Muita gente boa surgindo e se destacando.

Só temos que lembrar que o hip hop no Vale do Paraíba é muito antigo. Ninguém pode se achar dono da cena. Porque a internet faz as coisas circularem muito rápido e “nego” pode acabar se iludindo.

O hip hop, pra mim, é muito sagrado, então vamos com calma, respeitando os pioneiros, respeitando os que estão chegando agora e lembrando que nossa missão é fazer música boa, com conteúdo e não ostentar ilusão. “Desencana, a fama que matou Diana” já dizia o maestro.

HH Vale - Como campeão do Prêmio Hutúz e mais outros eventos que estão no seu currículo, você é espelho pra muita gente que ta chegando agora. Qual a dica para quem quer seguir o mesmo caminho?
Ralph - O Hutúz foi muito louco porque mostrou que um cara que surge do nada pode chegar e ter seu lugar na cena sem passar por cima de ninguém. Só com fé, raça e coragem.

E a dica que eu dou é exatamente para não seguir o mesmo caminho. O caminho é um só, mas são feitos de jeito diferente, “saca”?! Vamos com amor, verdade e respeito que os caminhos se abrem. Seja você mesmo!

HH Vale – De tempos, em tempos observamos a mudanças na cultura hip hop em todo Brasil. Você acompanha essas mudanças?
Ralph - Acompanho as mudanças como acompanho as mudanças dos tempos em geral; o mundo todo muda...e rápido. Agente pode mudar também, tipo se transformar pra evoluir; mas sem perder a essência, sem esquecer de quem Eu Sou.

HH Vale – Deixe um salve!
Ralph - Agradeço Clementina de Jesus, Clara Nunes, João Nogueira, João Donato, João do Vale, Paulinho da viola, Jorge Bem, Tim Maia, Cartola, Africa Bambata, Bob Marley, John Coltrane, James Brown, Fela Kuti e todos os mestres da música. Nosso rap tem que buscar o peso dos beats do Jay-z sim, mas se esquecer desse alicerce aí, meu amigo, não vai pra frente.

Pra todos do Vale do Paraíba, um abraço no coração! Tenho orgulho de ter nascido nessa terra, nossa caminhada é bonita, família. Chegamos a lugares importantíssimos sem muita mídia, e com muito pouco apoio financeiro. Acredito na gente! “Vamo que vamo” que nossa realidade é aqui. A região é imensa, vamos seguir rumo às capitais, mas tem muita coisa pra acontecer por aqui mesmo. Botem fé.

MYSPACE MC RALFH

BLOG - MC RALFH

ENTREVISTA FEITA POR - MAÍRA FORTES


ENTREVISTA SEDIA GENTILMENTE PELO SITE - HIP HOP VALE

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